Propomos uma melhor compreensão do que é este hábito repetitivo degenerativo chamado de vício, para isolar dúvidas, preconceitos ou julgamentos sobre pessoas que sofrem deste mal.
A palavra “vício” é derivada de um termo em latim para “escravizado por” ou “vinculado.” Qualquer pessoa que tenha lutado para superar um vício ou tentou ajudar alguém a fazê-lo, entende o porquê.
O vício exerce uma influência muito poderosa no cérebro e se manifesta de três maneiras distintas:
Desejo para o objeto do vício;
Perda de controle sobre seu uso;
Envolvimento contínuo com ele, apesar das consequências adversas já conhecidas pela pessoa viciada.
Por muitos anos, especialistas acreditavam que apenas álcool e drogas poderosas poderiam causar dependência. Tecnologias de neuro-imagem e pesquisas mais recentes, no entanto, têm mostrado que outras atividades, tais como jogos, compras e sexo, também podem resultar em vício.
É importante saber que ninguém inicia uma atividade ciente do risco de ser dependente, mas poderá acabar na armadilha inesperadamente.
Na década de 30, pesquisadores acreditavam que as pessoas que desenvolveram vícios eram moralmente inaptas ou fracas de autocontrole, porém hoje a dependência é reconhecida como uma doença crônica, que altera a estrutura e a função cerebral.
Assim como algumas doenças causam danos ao coração e a diabetes prejudica o pâncreas, a dependência afeta o cérebro.
Isso acontece quando o cérebro passa por uma série de mudanças iniciadas pela ilusão do prazer e direcionadas a um comportamento severamente compulsivo.
Processo de aprendizagem
Os cientistas acreditavam que a experiência do prazer, por si só, era suficiente para levar as pessoas a continuar a busca por substância ou atividade viciante. Mas, a pesquisa mais recente sugere que a situação seja uma pouco mais complicada.
A dopamina não só contribui para a experiência do prazer, mas também desempenha um papel na aprendizagem e na memória: dois elementos-chave na transição de apreciação ao vício.
De acordo com a teoria atual sobre a dependência, a dopamina interage com outro neurotransmissor, o glutamato, para assumir o sistema de aprendizagem relacionado com a recompensa do cérebro. Este sistema tem um papel importante na manutenção da vida, pois une atividades necessárias para a sobrevivência humana com prazer e recompensa.
O circuito de recompensa do cérebro inclui áreas envolvidas com motivação e memória, bem como com prazer. Substâncias e comportamentos viciantes estimulam o mesmo circuito e são capazes de sobrecarregá-lo.
O uso repetido de uma substância ou comportamento viciante faz com que as células nervosas no núcleo accumbens e córtex pré-frontal (a área do cérebro envolvida no planejamento e execução de tarefas) comuniquem-se de uma maneira em que ambos passam a querer algo que gostaram e, por sua vez, nos conduz a ir atrás disto. Ou seja, este processo nos motiva a agir em busca da fonte de prazer.
Princípio do prazer
O cérebro registra todos os prazeres da mesma forma, tanto se originar de uma droga psicoativa, quanto de uma recompensa monetária, de um encontro sexual ou uma refeição preferida.
No cérebro, o prazer tem uma assinatura distinta: a liberação do neurotransmissor dopamina no núcleo accumbens (parte do cérebro ativada quando as pessoas recebem recompensas), um aglomerado de células nervosas que se localizam abaixo do córtex cerebral.
A liberação de dopamina no núcleo é tão consistentemente associado ao prazer que os neurocientistas se referem à região como centro de prazer cerebral.
Todo abuso de drogas, desde a nicotina até a heroína, pode causar um aumento particularmente poderoso de dopamina no núcleo accumbens.
A probabilidade de que a utilização de uma droga ou participação em uma atividade compensadora provocarão a dependência está diretamente relacionada com a velocidade com que ela promove a liberação da dopamina e sua intensidade.
Desenvolvimento de tolerância
Ao longo do tempo, o cérebro se adapta às situações fazendo com que a substância ou a atividade procurada se torne menos agradável.
De maneira natural, as recompensas geralmente só vem com o tempo e esforço.
Como dito anteriormente, drogas e comportamentos viciantes fornecem um atalho para essa sensação, inundando o cérebro com dopamina e outros neurotransmissores. Nosso cérebro não consegue resistir facilmente a este impulso.
Drogas que causam dependência, por exemplo, podem liberar de duas a dez vezes mais a quantidade de dopamina que as recompensas naturais, e fazem isso mais rapidamente e de forma mais consistente.
Em uma pessoa na direção do vício, os receptores cerebrais ficam sobrecarregados. O cérebro responde produzindo menos dopamina ou eliminando os receptores de dopamina – uma adaptação semelhante a baixar o volume de um alto-falante quando o som está excessivamente alto.
Como resultado destas adaptações, a dopamina passa a ter menos impacto no centro de recompensa do cérebro.
As pessoas que desenvolvem um vício acreditam que com o tempo, aquela substância já não lhes oferece mais tanto prazer. Elas precisam de doses maiores ou de substâncias mais fortes para obter a mesma quantidade alta de dopamina, pois seus cérebros já estão adaptados àquelas substâncias – o nome dado à tolerância.
Compulsão assumida
O processo de controle da compulsão assumida inclui o hipocampo e as amígdalas armazenarem informações sobre os fatores ambientais associados à substância desejada, de modo que possa ser rapidamente localizada. Estas memórias ajudam a criar uma resposta condicional – desejo intenso – sempre que a pessoa encontra estes estímulos ambientais.
Os desejos podem contribuir não só para o vício, mas também para uma recaída depois de uma sobriedade duramente conquistada.
Uma pessoa viciada em heroína pode se encontrar em perigo de recaída quando vê uma agulha hipodérmica, por exemplo, enquanto outra pessoa pode começar a beber novamente depois de ver uma garrafa de whisky.
Aprendizagem condicionada ajuda a explicar por que as pessoas recaem ao vício, mesmo depois de anos de abstinência. A recuperação é possível Ajuda profissional acelera e simplifica o processo de desenvolvimento do auto controle para o vício, além de melhor preparar o indivíduo a lidar melhor com as frustrações e os conflitos diários da vida, sem que o adicto considere essencial recorrer ao veneno para voltar a se sentir bem
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